Por necessidade e opção, executivas flexibilizam licença-maternidade

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Com gêmeos recém-nascidos e as mamadas programadas para cada três horas, o cálculo era exato: Cláudia Zapparolli tinha 40 minutos de pausa entre uma amamentação e outra. E era esse tempinho que a executiva da Samsung aproveitava para ler os e-mails corporativos e receber telefonemas profissionais.

"Montei uma estrutura antes do parto e, nos meses fora do escritório, fiquei disponível para a empresa, mas até certo ponto", diz ela. Uma maratona que começou no segundo mês de vida dos meninos - hoje eles têm 1 ano e 2 meses - e durou até o fim da licença-maternidade, emendada com um mês de férias.

A história de Cláudia é um exemplo da realidade de muitas executivas ante à maternidade. Ocupantes de cargos estratégicos, essas mulheres acabam não se ausentando do trabalho, mesmo que não estejam fisicamente no escritório. Um cenário mais possível com as tecnologias, as conferências telefônicas e as reuniões por Skype.

A legislação brasileira estabelece o afastamento mínimo e remunerado de 16 semanas (mais informações nesta página). Tempo considerado pequeno por muitas mães, mas exagerado por boa parte das empresas.

"Pode não parecer, mas a legislação brasileira é muito rígida. E isso, ao mesmo tempo em que protege a mulher, pode também atrapalhar. Especialmente quando se trata de cargos de alto escalão", afirma o consultor Jeffrey Abrahams, que trabalha no recrutamento de executivos.

É por essa razão, explica ele, que, apesar de o tabu de contratar mulheres ter sido vencido, grande parte das empresas ainda resiste à ideia de recrutar uma gestante. Uma estatística que poupou, na semana passada, uma das executivas mais bem pagas do mundo. Grávida de seis meses, a americana Marissa Mayer, de 37 anos, deixou o Google, onde atuava havia 13 anos, para assumir o cargo de presidente executiva do Yahoo! por um contrato de US$ 1 milhão por ano.

O inusitado da situação virou notícia em todo o mundo, principalmente pelo compromisso de Marissa em retornar ao trabalho apenas duas semanas após o parto. Missão que até Cláudia questiona. "Deixa nascer. Se ela for amamentar, por exemplo, é impossível ficar fora com 15 dias de vida do filho. Vai mandar o leite por e-mail?", brinca. "Não há milagre, mas também não deve haver extremismo. A gente entende a organização, mas a empresa precisa ser compreensiva."

Flexibilidade. É esse ceder recíproco que defende Renata Fabrini, sócia da Fesa, empresa de recrutamento de altos executivos. "Eu percebo as lideranças mais flexíveis e abertas mas, é óbvio, esperando uma contrapartida da mulher. Não dá para ter ingenuidade nesse sentido", avalia.

Ela conta que recentemente indicou uma grávida a um cliente e o processo só não progrediu porque a candidata desistiu da vaga. "Se houver comprometimento mútuo, não vejo por que isso não acontecer", defende. E alfineta um pouco mais: "Quinze dias após o parto, se há uma infraestrutura adequada, a mulher vai ao shopping e ao cinema com o marido. Por que não poderia ir à uma reunião? Acho que é preconceito, até."

Dilce Madureira concorda. Mãe de uma garota de 8 anos e de gêmeos de 4, ela não parou na licença-maternidade. "Não tenho paciência de ficar alheia ao mercado por tanto tempo", diz a gerente de vendas da Promega, uma empresa americana de biologia molecular.

Ela não foi ao escritório, mas, a partir do segundo mês, participou de tudo. "Eu ligava, envolvia-me nas decisões. Até poderia ter ficado de fora, mas sabia que tinha metas a cumprir e tinha em mente que minha participação influenciaria nisso. Se me oferecessem seis meses em casa, eu não aceitaria."

Afastamento. Executiva de uma empresa de agronegócio alemã, Andrea Veríssimo discorda absolutamente dessa decisão. Quando seu filho nasceu, em 2005, emendou licença-maternidade com as férias. "Desliguei-me completamente e nada saiu do eixo com a minha ausência." Para ela, o comportamento das mães reflete a posição da empresa. "Sinto uma diferença cultural. Organizações americanas cumprem os quatro meses obrigatórios. Já a maioria das alemãs aderiu ao recesso de seis meses."


Ministra quer aumentar período de afastamento obrigatório


Pela legislação brasileira, todas as mulheres têm o direito a quatro meses de licença-maternidade, com a possibilidade de mais dois - o que cada empresa pode ou não adotar.

Durante os quatro primeiros meses da licença, o salário é pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e os outros dois pela empresa. A despesa que a empresa tiver com a licença-maternidade nesses dois últimos meses poderá ser descontada na hora da declaração anual do Imposto de Renda.

As estimativas são de que cerca de 10 mil empresas no País aderiram aos seis meses de licença facultativa.

A ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Eleonora Menicucci, anunciou, ao assumir o posto no início deste ano, que a ampliação da licença-maternidade para seis meses obrigatórios é uma de suas bandeiras.

Segundo os médicos pediatras, os 180 dias não são um período definido aleatoriamente. Tanto que foi a Sociedade Brasileira de Pediatria quem sugeriu, em 2005, a elaboração de um projeto de lei que previa esse período.

Os seis meses correspondem ao tempo do aleitamento materno exclusivo, importante para evitar alergias e doenças como diarreia e pneumonia.

Além disso, também são importantes os estímulos visuais, olfativos e auditivos, e a voz da mãe é a principal referência do recém-nascido.



Veículo: O Estado de S.Paulo


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