Querida, encolhi a comida

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Mudanças demográficas, nos hábitos do consumidor, na renda e tentativas de acomodar a inflação explicam por que as embalagens estão cada vez menores


RICARDO MIOTO DE SÃO PAULO

Se os preços pararam de aumentar diariamente, algo mudou nas prateleiras dos supermercados nos últimos 20 anos, desde a implementação do Plano Real: várias embalagens diminuíram.

Entre os exemplos, estão bandejas de iogurte, pacotes de biscoito recheado e de papel higiênico (veja quadro).

Há duas explicações principais para isso. Por um lado, há razões demográficas e de comportamento do consumidor. Por outro, reduzir embalagens sem cortar preços pode ser uma maneira de acomodar a inflação.

A principal razão demográfica é a redução no tamanho das famílias. Enquanto em 1991, segundo o IBGE, 1,9 milhão de brasileiros moravam sozinhos, em 2012 esse número já chegava a 8 milhões.

Além disso, aumentou também o número de casais sem filhos, como aponta a especialista em estudos populacionais Ana Silvia Volpi Scott.

"Mais e mais casais estão optando por isso. É uma mudança sensível para uma sociedade em que, até poucas décadas atrás, as pessoas eram educadas para se casar e procriar, como se o sucesso da família ou mesmo a felicidade dependesse disso."

Com pouca gente em casa, aumenta a demanda por produtos com embalagens menores --especialmente no caso de perecíveis.

No campo dos hábitos de consumo, é preciso levar em conta que há hoje tanto maior renda como maior variedade de produtos, lembra o professor da ESPM Fábio Mariano.

Ele cita o caso dos xampus: "Hoje, não se compra mais só um pote grande para a família inteira, mas vários, de diferentes tipos, conforme os gostos de cada um".

Há ainda as próprias limitações de renda da nova classe média --embalagens menores tornam o consumo mais acessível.

Além disso, a queda da inflação tornou as compras mais picotadas --as famílias pararam de fazer estoque em casa. Ir ao mercado e encher dois ou três carrinhos se tornou uma cena mais rara.

A decadência da compra mensal também deixou uma vítima: os enormes hipermercados, cujo modelo de negócios entrou em crise.

MAQUIAGEM

Nem tudo foi adaptação às novas necessidades do consumidor, porém. Do Plano Real para cá, em vários momentos fabricantes se opuseram a consumidores e governo, que acusavam "maquiagem" nas embalagens --elas teriam menos conteúdo, mas continuavam custando o mesmo. Seria uma espécie de inflação disfarçada.

No começo da década de 2000, tais casos se tornaram tão frequentes que o Ministério da Justiça emitiu uma portaria obrigando os fabricantes a destacarem nas embalagens avisos sobre eventuais reduções. O argumento era que o consumidor estava habituado a determinada quantidade, e alterações poderiam induzi-lo ao erro.

"Um caso típico foi o do papel higiênico, em que a percepção do consumidor sobre a quantidade de metros em cada rolo é limitada --afinal, ninguém mede isso no supermercado", afirma Mariano.

Ele afirma, porém, que nem todas as reclamações sobre produtos menores e preço maior procedem.

"A redução da embalagem leva a maiores custos operacionais. É preciso compreender que isso é repassado para o consumidor. É natural que, ao procurar, por exemplo, bandejas de iogurte menores, o consumidor acabe pagando mais por unidade."



Veículo: Folha de S. Paulo


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