Uso de cartão na Argentina aumenta após promoções

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Comprar com cartão de crédito na Argentina pode sair até 30% mais barato do que pagar à vista. Promoções como essa, válidas apenas para cartões emitidos no país, podem ser vistas em todos os supermercados de Buenos Aires. Em geral, o desconto é lançado como crédito na fatura do cartão no mês seguinte, até um determinado limite de despesa.

Nas grandes redes de farmácia, é possível retirar até 300 pesos (US$ 55) no caixa sem custo. Esses são alguns exemplos do esforço feito pelas instituições para tentar elevar a bancarização no país.

No entanto, segundo Ruben Iparraguirre, superintendente de finanças do Banco Patagônia, a política de descontos começa a chegar a seu limite. "Esse foi um esforço para bancarizar a economia, que começou com o Santander em 2004 e foi se estendendo para todo o sistema, até que por volta de 2010 todos os bancos aderiram para não perder clientes. Como a base já cresceu, a tendência é que estas bonificações diminuam no curto prazo", disse.

O crédito fácil para as linhas curtas, um dos motores para a explosão de consumo nos últimos anos na Argentina, ajudou a levar a quantidade de cartões emitidos passar de 31 milhões para 57 milhões nos últimos seis anos, entre cartões de crédito e débito.

"A chave para entender a bancarização na Argentina é perceber que o argentino está dentro do sistema financeiro, mas procura utilizá-lo pouco", afirma Ramiro Castiñera, economista chefe da consultoria Econométrica. Castiñera ressalta que os cartões de débito e crédito se multiplicam em uma mesma base de clientes, que acumulam plásticos de vários bancos para aproveitar as promoções.

"A Argentina tem 32,8 milhões de contas, o que parece bastante frente a 40 milhões de habitantes. Mas, deste total, 85% são contas-salário ou de aposentadorias. Existem apenas 4,2 milhões de contas correntes desvinculadas."

Em um país com taxas de crescimento acima da brasileira nos últimos dez anos e inflação real da ordem de 25% ao ano, a taxa nominal máxima de juros para empréstimos pessoais é de 76% ao ano, segundo tabela publicada pelo Banco Central argentino este mês. No rotativo do cartão de crédito, o maior juro é de 59% anual.

A ausência de linhas de longo prazo faz com que o volume de crédito sobre o PIB não tenha avançado na mesma proporção: de 14,5% sobre o produto interno bruto em 2007, atingiu 18,4% no ano passado, segundo o Banco Mundial. É a menor relação entre todos os países da América do Sul, excluindo as Guianas, e ainda está abaixo dos 24,9% registrados em 1999, antes do colapso financeiro da paridade entre o peso e o dólar, que aconteceu dois anos depois.

De acordo com um executivo de uma entidade patronal do setor, a inflação alta na Argentina colaborou para o aumento do número de transações bancárias. "Quando um argentino dá vazão ao consumo para tentar proteger seus recursos da inflação, ele aumenta o intercâmbio de bens e isso hoje necessariamente passa pelo sistema financeiro", comentou.

Outra política do governo da presidente Cristina Kirchner que acabou beneficiando os bancos é o regime de restrições à compra de dólares. Há mais de um ano, a compra de dólares para fins de investimento foi proibida no país. Sem ter o que fazer com o excesso de pesos, cuja base monetária se expande a uma média de 35% a 40% ao ano, uma parcela cada vez maior da população se rendeu a aplicações com taxas fixas, de no máximo 20% anuais, abaixo da inflação. O prazo de aplicação sempre é curto: os valores são resgatados em cerca de 60 dias.

Segundo o último relatório do BC, com dados de fevereiro, o total destinado a aplicações de prazo fixo aumentou 43,8% em quinze meses, atingindo 202 bilhões de pesos (cerca de US$ 40 bilhões, pela cotação de cinco meses atrás). "O fato é que o governo foi relativamente bem sucedido em sua estratégia de pesificar a economia. Ele deixou os poupadores sem outras opções", diz o executivo.

"O governo criou 1 milhão de empregos públicos em dez anos, incorporou ao sistema de previdência 2 milhões de pessoas que não eram contribuintes e implantou programas de transferência de renda que beneficiam 3,5 milhões de habitantes. Houve um aumento de base, mas a confiança no sistema não aumentou", disse a economista Agustina Leonardi, da Fundação Liberdade e Progresso.

Nos anos 80, o sistema financeiro argentino conviveu com dois processos de hiperinflação e se concentrou em financiar o déficit público crescente de então, que chegou a 10% do PIB. A nova crise, em 2001, surpreendeu o sistema financeiro atrelado não apenas à dívida governamental mas a passivos em dólar, no momento em que a desvalorização cambial chegou a 270% em menos de um ano.

"Hoje o setor público não representa mais que 8% dos ativos do sistema e as aplicações em dólar aproximadamente a mesma porcentagem do passivo. É um sistema menor, mas mais sólido", afirma Castiñera.



Veículo: Valor Econômico


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