Além da tentativa de reverter a perda de espaço no mercado internacional provocada pela queda nas exportações, o setor calçadista nacional enfrenta um novo desafio: a importação de peças de calçados. "As partes de calçado têm assumido uma relevância muito forte para as importações. Antes de 2008, esse fenômeno de importações de calçados não era relevante, mas começou a ser importante a partir daí", disse o diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein.
As importações, tanto de calçados quanto de partes de calçados, estão crescendo. Até maio de 2012, a importação de cabedais (parte superior do calçado), por exemplo, já havia aumentado 43% no ano, em relação ao volume dos cinco primeiros meses de 2011, com 6,2 milhões de pares de cabedais comprados. Com relação aos valores pagos por partes, o país importou US$ 28,7 milhões, o que representa aumento de 122%, no mesmo período.
A importação de partes de calçados, de acordo com a Abicalçados, pode ser usada para burlar medidas antidumping, ao permitir a entrada no mercado nacional de produtos desmontados. "Em 2008, perdemos 44 mil postos de trabalho por conta das importações, mas logo em seguida houve uma aplicação, em 2010, de medida antidumping contra as importações da China", afirmou Klein.
De acordo com Klein, depois de estabelecida a barreira, houve uma recuperação da taxa de empregos no setor, que voltou a cair com a intensificação das importações de partes de calçados de países asiáticos. "Depois ocorreu um desvio das importações, que antes vinham da China e passaram a vir do Vietnã e da Indonésia. Passaram a vir partes de calçados e por isso estamos com quedas e picos de empregabilidade ao longo do período", afirmou.
Prontos - A importação de pares de calçados prontos, por sua vez, já aumentou 16% em valores nos cinco meses deste ano, passando de US$ 178,9 milhões nos cinco primeiros meses de 2011 para US$ 207,9 milhões no acumulado deste ano até maio.
De acordo com Klein, as importações de calçados de países asiáticos foram potencializadas por três fatores: a inserção crescente dos produtos chineses no mercado nacional, a valorização do real frente ao dólar e a crise no mercado internacional. A crise internacional gerou um excedente bastante expressivo de produtos asiáticos que foi redirecionado para o Brasil", afirmou.
Com as importações crescendo e as exportações em queda desde 2008, as expectativas do setor para este ano, mesmo com a recente alta do dólar, ainda não são otimistas. De janeiro a maio, o saldo da balança comercial do setor ficou em US$ 236 milhões, ante US$ 373 milhões no mesmo período de 2011. "O câmbio pode oferecer condições de preço mais adequadas ao calçado brasileiro, mas o cenário também pode ser afetado negativamente pela crise internacional do hemisfério norte. Ainda é cedo para dizer", disse Klein.
Antes da crise de 2008, as exportações representavam 25% da produção calçadista nacional. Atualmente, o número beira os 13%. No acumulado deste ano até maio, o setor faturou US$ 444 milhões em exportações, o que mostra queda de 20% em relação a igual período de 2011, quando o faturamento foi de US$ 551,8 milhões. (AE)
Governo cria sobretaxa de 182%
O governo criou uma "lista positiva" de importadores brasileiros de solados e cabedais para fabricação de calçados que poderão comprar os componentes na China sem a aplicação de sobretaxa. As demais empresas passarão a pagar 182% a mais a partir de hoje. A medida é resultado da conclusão da segunda investigação de "circunvenção" (suspeita de triangulação ou importação de componentes para mera montagem no país) envolvendo calçados vindos da Indonésia e do Vietnã e partes e peças provenientes da China.
O Departamento de Defesa Comercial (Decom) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) investigou nos últimos nove meses uma denúncia da Associação Brasileiras de Calçados (Abicalçados) de que importadores brasileiros estavam burlando a sobretaxa de US$ 15,85 aplicada por par de sapatos importado da China. A suspeita era que as empresas estariam trazendo sapatos chineses passando pela Indonésia e pelo Vietnã ou comprando partes e peças na China para mera montagem no Brasil.
A secretária de Comércio Exterior do ministério, Tatiana Prazeres, antecipou que a investigação concluiu que o aumento das importações de sapatos da Indonésia e do Vietnã não teve relação com a aplicação da sobretaxa. "Estes países têm indústria consolidada no setor calçadista e o que vendem para o Brasil é porcentualmente pouco relevante, quando analisamos as exportações destes países para o resto do mundo. Investigamos se compravam partes e peças da China e montavam lá, e isso não se comprovou", explicou.
O Decom concluiu que a maior importadora brasileira de cabedais e solados da China, a Mega Group, estava fazendo a mera montagem no Brasil para fugir da sobretaxa sobre calçados acabados, que vigora desde março de 2010 para conter a prática de dumping. O Mdic concluiu que as importações de peças superam 60% do total de componentes usados na produção e que não há agregação de valor na mercadoria. A Mega Group é responsável por 14% do total de partes e peças importadas da China pelo Brasil.
"O que é importante é que, caso esta importadora mude de nome ou passe a importar por meio de outra empresa, nós conseguiremos aplicar a sobretaxa, porque terá uma lista positiva com os importadores que não irão pagar a sobretaxa", destacou a secretária. Tatiana informou que a lista será composta por 95 importadores, que serão monitorados.
Veículo: Diário do Comércio - MG