Custos empurram frete ladeira acima

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Mudanças tributárias, medidas do governo e aumento dos combustíveis fazem valor pago para transportar mercadorias aumentar até 50% em um ano. E vem mais reajuste por aí


No aguardo pelo início do processo de duplicação das principais rodovias que cortam Minas, o que deve contribuir para desonerar o custo do transporte, empresas de logística têm sofrido com uma série de medidas que contribuem para a escalada dos custos. Em pouco mais de um ano, pelo menos quatro ações tiveram forte impacto na elevação do frete, o que, segundo o setor, induziu a aumento entre 40% e 50% no valor do custo, inflacionando toda a cadeia de produção. No mês que vem, de fato deve ter início a fiscalização da Lei Federal 12.619, que regulamenta a profissão de motorista, o que deve acarretar no repasse integral do aumento de custo gerado pela medida para os preços para o consumidor.

As primeiras ações foram sentidas ainda nos primeiros dias do ano passado, quando entrou em vigor no estado a nova alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do diesel e do etanol. Como forma de incentivar o uso do álcool, o governo reduziu a carga tributária, mas, para compensar as perdas de receita, aumentou a alíquota do diesel em três pontos percentuais. Nas bombas de combustível, a alteração significou aumento médio de R$ 0,04 por litro, o que, segundo a Federação das Empresas de Transportes de Carga de Minas Gerais (Fetcemg), significou à época reajuste de 6% no frete.

Paralelamente, só que desta vez em todo o país, entrava em vigor legislação que introduzia a tecnologia Euro 5 nos caminhões novos. De março para a frente, somente seria possível comprar veículos de carga que tivessem a tecnologia considerada menos poluente. Mas o benefício ecologicamente correto tem alto custo para as empresas – caminhão até 15% mais caro –, além de tornar obrigatório o abastecimento com o diesel S-50, com preço também superior ao do diesel comum – aproximadamente R$ 0,15 o litro.

Mas as altas mais significativas devem ser sentidas neste ano. No mês passado, cedendo às reivindicações da Petrobras, que pleiteava aumento dos combustíveis nas refinarias para reduzir as perdas com a importação, o governo federal aumentou em 5,4% o valor do diesel. Somado a isso o aumento da alíquota no ano passado, o litro do combustível teve variação de 12,83%. Fator que tem maior impacto no valor do frete (30%), seguido pelos custos de pneu (21%) e manutenção (15%), além de questões políticas e econômicas.

DESCASO CARO A partir do mês que vem, tem início efetivamente a fiscalização da Lei do Descanso. Depois de quase um ano de a legislação entrar em vigor, a Polícia Rodoviária Federal deve punir os motoristas que não cumprirem à risca a lei. Assim, será preciso parar 30 minutos a cada quatro horas de percurso e repousar 11 horas por dia. A consequência é o aumento entre 22% e 28% do valor do frete, segundo a associação de empresas de transporte NTC & Logística. “Está numa fase de negociação. Mas não tem remédio. Que vai aumentar o custo da mercadoria no supermercado vai, mas é o preço a ser pago por uma maior segurança”, afirma o diretor técnico da associação, Neuto Gonçalves dos Reis.

A perda de produtividade da frota é certa. A lei vai obrigar as empresas a reduzir o número de viagens ou a contratar um motorista auxiliar para dividir a viagem com o condutor principal. Com isso, a expectativa é que falte mão de obra, onerando ainda mais. Diante disso, as empresas de transporte têm pela frente um problema mais complicado. Isso porque os profissionais não podem fazer mais do que duas horas extras por dia (ou seja, carga horária máxima de 10 horas), enquanto os autônomos podem aproveitar uma brecha na lei para rodar até 12 horas por dia.

PRESSÃO O presidente do Sindicato das Empresas e Transportadores de Combustível e Derivados de Petróleo do Estado de Minas Gerais (Sindtanque-MG), Irani Gomes, considera a legislação positiva por aliviar a carga dos trabalhadores, no entanto é incisivo quanto ao custo da medida. Ele afirma que há três décadas a mão de obra representava 15% do custo do frete e que com as mudanças a fatia será de 38%. “O custo primeiro será para o embarcador, que vai repassar para o consumidor. É um efeito dominó”, avalia Irani, que, no ano passado, por pelo menos três vezes, organizou manifestações contra o aumento do ICMS do diesel e o alto custo gerado para a categoria. Ele adverte que a negociação com o governo estadual deve ser retomada, principalmente com as novas medidas.

Dependência ruim

Em função das deficiências logísticas o frete pago para transporte de grãos no Brasil é 6,5 vezes superior aos valores praticados nos Estados Unidos e na Argentina. O problema no Brasil, segundo a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais e Algodão (Anec) é a dependência do transporte rodoviário, que não é o mais indicado para grandes distâncias. Nesses casos, as cargas deveriam seguir por hidrovias ou ferrovias. Segundo a Anec, cerca de 53% da safra brasileira é transportada por rodovia, 36% por ferrovia e apenas 11% por hidrovia. Nos EUA a hidrovia responde por 60% do escoamento e as ferrovias, por 35% e apenas 5% para o meio rodoviário.

Alta na estrada chega à mesa

A escalada vertiginosa da planilha de custo das transportadoras nos últimos 13 meses deve ter maior incidência sobre a cadeia do agronegócio. Depois de bater recorde de produção no ano passado, a safra deste ano promete ser a maior da história novamente e criar certa disputa para ver quem consegue contratar. Nos meses da safra (principalmente fevereiro e março), a associação de empresas de carga NTC & Logística vislumbra que o frete pode ter aumento de até 50% sobre o já registrado, o que pode contribuir para que o grupo alimentos continue a pressionar a inflação. “Com a oferta grande de alimentos, o frete terá um peso ainda maior”, afirma o diretor técnico da associação, Neuto dos Reis.

E os primeiros sinais de pressão nos preços já são sentidos. A colheita da soja ainda está na fase inicial na Região Centro-Oeste, onde os trabalhos começam mais cedo, mas os valores dos fretes já subiram 21%. O aumento foi provocado pela maior demanda para transporte da safra recorde de grãos e também pela alta nos custos, em função da nova Lei dos Caminhoneiros, que obriga as empresas a conceder aos motoristas um período de descanso de 30 minutos a cada quatro horas de viagem e repouso de 11 horas ao fim da jornada diária.
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Um levantamento feito pela Associação Nacional dos Exportadores de Cereais e Algodão (Anec) junto às tradings e cerealistas mostrou que o valor do frete para transporte de grãos até os portos passou de US$ 81/tonelada na safra passada para US$ 98/tonelada nesta safra. Na safra de 2003, o frete tinha custo de US$ 44 a tonelada, tendo subido para US$ 91 no ano passado, segundo consultorias de agronegócio, variação de 106,81%.

No ano passado, segundo o informante do Grupo de Pesquisa e Extensão em Logística Agroindustrial (Esalq-Log) em Minas, Marcus Aníbal Pereira, o frete para o Porto de Santos já estava 35% mais caro e em rotas regionais 80%. A avaliação é que o horizonte de maiores volumes na produção e de demanda para transporte, como se deu no ano passado e se repetirá neste ano, não é aterrorizante, mas certeza de alta no preço dos fretes. O diretor técnico da NTC & Logística, Neuto dos Reis, avalia que as empresas exportadoras de produtos agrícolas terão forte redução nos lucros, o que é justificado pelo fato de os valores das commodities serem fixados em bolsa. Com isso, apesar de a safra bater recordes, o retorno será menor. (PF com agências)



Veículo: Estado de Minas


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