Há shopping centers demais no Brasil?

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Um novo centro de compras será inaugurado no Morumbi, próximo a outros quatro, em 2016. Até que ponto casos assim atendem a uma demanda reprimida ou representam sobreposição? Especialistas debatem

Boa localização, alta densidade populacional no entorno, aquisição de bons pontos comerciais em tempos de recessão econômica e ganho de escala para reduzir custos. É com esses parâmetros que a incorporadora israelense Gazit-Globe têm conquistado espaço no mercado brasileiro.

Em sete anos, a companhia passou a contar com seis shopping centers e um supermercado em seu portfólio. Entre eles, promoveu a revitalização dos shoppings Light, Top Center e Mais, na capital paulista, e tem participação no prédio do hipermercado Extra, no Itaim Bibi. Até 2019, a companhia planeja abrir mais um shopping no local, terreno do antigo Mappin.
 
O oitavo empreendimento no portfólio será o shopping Morumbi Town, que a Gazit apresentou recentemente ao Conselho de Varejo da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).

Localizado na Av.Giovanni Gronchi, região com potencial de consumo de R$ 6 bilhões anuais e 52,5% do público classificado nas classes A e B, o novo centro de compras está previsto para ser inaugurado em abril de 2016.

Do total de 60% de lojas-âncora, estão empresas do porte da Riachuelo, Tok&Stok, supermercado Zaffari e academia Bioritmo. No quesito entretenimento, o destaque são os R$ 15 milhões investidos em salas de cinema com I-Max, da Cinesystem.

Há até um playground na área externa interligado à praça de alimentação, entre outras facilidades, para atrair um público que enxerga o shopping como o seu “terceiro lugar”.“É um empreendimento que nasce com uma visão de marketing e uma preocupação com o mix bastante acentuada”, diz Mário Goldberg, diretor comercial da Gazit e superintendente comercial do novo shopping.

Mas também desponta em meio a uma questão amplamente debatida no setor: a sobreposição. Ou seja, a construção de shopping em um raio próximo a outros empreendimentos, o que poderia inviabilizar investimentos tanto do próprio empreendedor como dos lojistas – em especial, dos pequenos –, pela falta de fluxo suficiente para manter os negócios.  

O caso do Morumbi Town é emblemático: em um raio de 5 a 10 quilômetros estão estabelecidos quatro centros de compras: Market Place, SP Market, Campo Limpo e Jardim Sul.O último fica em frente ao novo empreendimento. E são exemplos como esse que geram a pergunta: tem shopping demais no Brasil?

NO LOCAL E NO MOMENTO CERTOS

O tema foi debatido no congresso de varejo Latam Retail Show, realizado na semana passada na capital paulista. Anteriormente, foi tema de debates e rodadas de apresentação de projetos de construtoras, investidores e lojistas nas reuniões do Conselho de Varejo da ACSP, ao longo de 2013 e 2014.

Glauco Humai, presidente da Abrasce (Associação Brasileira de Shopping Centers), disse que há 529 shopping centers em operação no Brasil. Parece excessivo mas, segundo ele, há mais de 5,5 mil municípios no país, sendo que só 192 possuem shoppings. Ou seja, há muito a crescer.

Do total, 96% estão sediados em cidades com mais de 100 mil habitantes, mas 36% das cidades com mais de 100 mil não têm. Por outro lado, citou a cidade paulista de Sorocaba, como exemplo de alto índice de sobreposição, mas que tem uma das menores ABLs (área bruta locável) por habitante.

“Muitos centros de compras surgem mais por decisão de empreendedores do que para atender a uma demanda do varejo", afirma. "Mas não basta avaliar os números friamente: é preciso entender como estava o momento da cidade e da economia antes”.

De acordo com o executivo, o consumidor visita 2,7 shoppings, em média. “Ele não é um cliente fiel. Portanto, um shopping não anula o outro.”  

Roberto Rique, CEO da Aliansce, mencionou os R$ 250 milhões, em média, investidos em determinados shoppings, que depois tiveram resultado anual negativo por que não deveriam ter sido construídos em locais que já eram bem atendidos por outros.“Houve muito assédio de capital, além de euforia e vaidade quando a economia estava boa. E que levaram alguns a tomarem decisões longe de serem conservadoras, que prejudicaram outros”, disse.

Mas, com as novas fronteiras do consumo se expandindo, e com a migração do varejo virtual para o físico, e vice-versa, não dá para deixar de investir.“O momento está difícil, e vamos voltar a crescer. Mas os hábitos mudam, e os shoppings se adaptam. Só depende de optar pelo momento e o local certos”, afirma. 

Se uma loja-âncora investe em média R$ 5 milhões para abrir uma loja em shopping, em tempos de “crescimento curto” a análise para se instalar em certos mercados pede muito mais critério, afirmou Marcos Tadeu, gerente de expansão da Riachuelo e membro do Conselho de Varejo da ACSP.

Porém, o mercado dá mostras de amadurecimento: em caso de sobreposição, muitos entendem quando percebem que chegaram atrasados. “Com isso, se unem a concorrentes para se fundir em um só empreendimento. Assim, dividem o lucro, ao invés de ficarem só com o prejuízo”, diz Tadeu.  

Para Fauze Barreto Antun, sócio da Pátria Investimentos - que se associou à incorporadora Tenco em 2007-, há muito espaço, sim. Mas para que não ocorra um jogo de “retornos marginais decrescentes” causado pela sobreposição, é preciso disciplina.

“Nenhum shopping nasce sem o apoio de âncoras ou megalojas. Se formos um competidor atrasado, não vamos entrar. Mas o mercado peca e leva prejuízo porque ainda há muito ego”, afirma.

DESAFIO DA CONCORRÊNCIA

Na reunião do Conselho de Varejo, Goldberg, da Gazit-Globe, disse que foi realizado um estudo de viabilidade de potencial para atender à demanda reprimida da região da Vila Andrade (Zona Sul)  “na ponta do lápis.”

“Trabalhamos em cima de dados, e não fizemos um projeto para competir com outro empreendimento. Quisemos criar um shopping de bairro e para o dia a dia. Não tem como dar errado”, afirmou.

Nelson Kheirallah, vice-presidente da ACSP e coordenador-geral do Conselho de Varejo, afirma que é importante existir proximidade dos empreendedores de shoppings para promover integração e evitar embates com os lojistas.

Mas, no caso específico do Morumbi Town, a concorrência direta, principalmente com o Jardim Sul, será uma realidade. Segundo ele, muitos varejistas queriam estar no Jardim Sul, um shopping já consolidado, mas que não tem mais espaço para expandir.

Por isso, têm aderido ao fronteiro Morumbi Town, que traz âncoras diferentes e conceito não só de compras, mas de prestação de serviços. "Vai demorar um pouco para maturar. Mas no atual cenário, é melhor fazer parte de um mix do que não estar em nenhum."

Porém, se de 2006 até agora o setor teve forte e saudável expansão puxada pelo consumo, segundo Luiz Alberto Marinho, sócio da GS&BW (divisão de real estate da GS&MD), hoje é preciso saber para onde caminha essa indústria. Com ou sem crise.

Segundo ele, de início, é preciso balizar as quatro dimensões do shopping para dar certo: ser o “terceiro lugar”; um centro de entrenimento exclusivo para trazer público; um “marketplace de ideias”, ou seja, uma plataforma de informação e tendências. E por último, conjugar todas para se adequar à realidade de cada mercado.

E se houver algum indício de sobreposição, que o shopping seja projetado primeiramente para atender às diferentes demandas reprimidas de cada local, afirma. Daí a importância de equalizar tudo isso de acordo com a vocação de cada empreendimento, de forma científica e customizada.

“Isso faz com que os shoppings não sejam mais projetados só para o consumidor comprar, mas para que se sintam bem. Porque quando se sentem, comprar é consequência”, afirma. Eis o desafio da concorrência.



Veículo: Site Diário do Comércio - SP


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