Setor farmacêutico pede maior transparência em parcerias

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Marco regulatório. Executivos evitam críticas diretas ao novo modelo de transferência de tecnologia, mas dizem que seleção de empresas precisa ser clara. Governo espera cortar gastos

 



A indústria farmacêutica tem avaliado como insuficiente a alteração no modelo de Parcerias de Desenvolvimento Produtivo (PDP) do governo federal. O marco regulatório tem recebido críticas por não conseguir por fim à falta de transparência nos processos.

"Houve uma melhora no processo de condução da parceria, mas a seleção do laboratório privado deveria ser feita a partir de um edital", defende o diretor da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), Pedro Bernardo.

Entre os executivos do setor, a mudança foi recebida com cautela. Na avaliação do presidente da Blanver, Sérgio Frangioni, as mudanças são positivas, entretanto, não está claro como os processos passarão a funcionar e se o novo marco trará mudanças efetivas.

"Atualmente, a questão dos preços desses medicamentos ainda é incerta", observa ele.

Segundo Frangioni, antes os empresários tinham a garantia do preço firmado pelo produto, considerando o tempo gasto em pesquisa e desenvolvimento até o início da distribuição, e, por isso, a mudança precisa ser observada com atenção.

"O novo acordo trará redução no preço e o governo não tem feito os pedidos no volume acordado na assinatura da PDP", critica o proprietário do complexo farmacêutico Cristália, Ogari Pacheco. Para ele, a mudança no acordo de preços e a falta de garantia do volume a ser adquirido colocam em risco o modelo de PDP.

O empresário, que também é presidente da Associação Brasileira da Indústria de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (ABIFINA), integra o grupo de farmacêuticas que pede regras mais claras para dar segurança ao investimento.

Falhas


Os pedidos da indústria farmacêutica para alterar o processo de PDP são feitos desde a criação do projeto (em 2012), diz Bernardo, da Interfarma. Mas as mudanças no modelo de parceria só ocorreram após escândalo envolvendo o laboratório Labogen, cujo acordo de PDP com o Ministério da Saúde foi contestado.

De acordo com a investigação da Polícia Federal, a empresa seria parte integrante de um esquema para lavagem de dinheiro do doleiro Alberto Youssef, preso na operação Operação Lava Jato.

Pressionado pelo escândalo, o Ministério da Saúde realizou uma consulta pública e, no mês passado, publicou a Portaria 2.531 com marco regulatório, que passou a estabelecer as obrigações de todas as partes envolvidas no projeto de PDP, com prazos fixos para realização e monitoramento do andamento das parcerias.

Seleção

Bernardo conta que outra crítica ao novo modelo é a manutenção da escolha do laboratório privado para as parcerias.

Agora o projeto de PDP passará por uma análise técnica conduzida por um grupo interministerial (Ministérios da Saúde; Ciência e Tecnologia; e Desenvolvimento, Indústria e Comércio). Mas a escolha final da empresa aprovada no processo ainda pertence ao laboratório público que receberá a transferência de tecnologia.

Na avaliação do presidente da Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Oficiais do Brasil (Alfob), Júlio Felix, o modelo de escolha deve ser mantido, pois é a instituição que receberá a transferência de tecnologia que saberá melhor avaliar qual empresa se adequa às características do laboratório. "Agora a escolha é formalizada, dando mais segurança para as partes que integram o processo de PDP", afirma Felix, que também é presidente do Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar).

Desse modo, o diretor da Interfarma sugere que o processo de entrada passe por novas alterações. "Nós sempre questionamos isso [o processo de seleção do laboratório], porque como a PDP não é feita em um modelo de licitação, deveria ao menos ser regulada por um edital de entrada", defende ele.

Em nota à imprensa, o ministro da Saúde, Arthur Chioro, afirma que a divulgação da lista de produtos estratégicos para o Sistema Único de Saúde (SUS) e o novo modelo de PDP garantem que as empresas tenham igualdade no processo.

O novo modelo prevê um cronograma a partir da lista de divulgação de medicamentos estratégicos, no final do ano. Assim, as empresas terão até abril de 2015 para apresentar suas propostas de parceria. Além disso, estão previstos prazos fixos para submissão e avaliação das propostas enviadas ao Ministério da Saúde.

Economia

A redução progressiva de gastos do Ministério da Saúde com a compra de remédios também motivou a mudança na PDP. A previsão do governo é que, com a finalização de todas as parcerias previstas, a economia chegue a R$ 4,1 bilhões por ano.

"O governo corre o risco de criar um ambiente de negócios difícil, pressionando cada vez mais os ganhos das fabricantes", conta o executivo da Blanver, Sérgio Frangioni.

A empresa, primeira farmacêutica a assinar um acordo de PDP com o ministério em 2009, espera faturar R$ 250 milhões este ano, destinando quase metade da produção para a demanda gerada pelas parcerias.

Na farmacêutica Cristália a percepção sobre a mudança é similar. "Nós estamos em um ano fiscal difícil para o governo e isso certamente afetou as PDPs, que foram contingenciadas, com redução dos preços em contratos já assinados", assinala Ogari Pacheco.

Atualmente, a farmacêutica tem 32 projetos de PDP em andamento e calcula ter feito aporte superior a R$ 350 milhões relacionado as parcerias, somando gastos com pesquisa, desenvolvimento e ampliação da capacidade produtiva feitos nos últimos quatro anos.

"O ministério é o nosso principal cliente e chega a representar 30% do faturamento", conta o empresário. No ano passado, a farmacêutica faturou R$ 1,5 bilhão e a expectativa é encerrar 2014 com R$ 1,6 bilhão.

Para o proprietário da paranaense Prati-Donaduzzi, Luiz Donaduzzi, o modelo de PDP não é atrativo para a empresa pelas regras. "Hoje, o nosso modelo de trabalho [licitação] com o governo é muito bom", diz.

Impacto


Segundo a Interfarma, as compras de remédios realizadas, atualmente, pelo governo representam cerca de 20% do mercado nacional, com aproximadamente R$ 10 bilhões.

Procurado pela reportagem do DCI, o secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Carlos Gadelha, por meio da assessoria de imprensa, afirmou não ter disponibilidade para conceder entrevista.




Veículo: DCI


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