Natal sem brilho na indústria

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Produção fica estagnada em outubro, e analistas esperam queda de 2,7% no ano

 



Às vésperas do Natal, a indústria brasileira ficou parada em outubro. Depois de queda de 0,2% em setembro, a produção se manteve no mesmo patamar em outubro, segundo dados do IBGE divulgados ontem. Este é o período em que tradicionalmente a indústria produz a pleno vapor para atender às encomendas do Natal, o que sugere fim de ano mais fraco para a indústria e varejo.

O desempenho decepcionante do início do quarto trimestre, abaixo do esperado pelo mercado, confirma a previsão de um ano de queda para a indústria brasileira. No ano, a redução já está em 3%. Segundo analistas, como a Rosenberg & Associados, o recuo em 2014 deve ser de 2,7%. Caso se confirme, esta será a segunda pior taxa da série histórica iniciada em 2002, melhor apenas de 2009, quando houve um tombo de 7,1% da produção na esteira da crise econômica mundial. Em 2013, a produção avançou 2,1%, após queda de 2,3% em 2012. Em outubro, a indústria estava produzindo a mesma quantidade de maio de 2012.

ESTOQUES ELEVADOS E DEMANDA FRACA

Na avaliação do gerente da Coordenação de Indústria do IBGE, André Macedo, o que ocorreu em setembro e outubro foi uma combinação de estoques elevados e demanda doméstica mais fraca, com comprometimento da renda das famílias e maior restrição ao crédito:

— É claro que tem redução da demanda doméstica, mas tem uma produção estocada que pode estar dando conta da demanda mais intensa desta época do ano. Isso justifica o comportamento moderado da indústria nos últimos dois meses.

A opinião é compartilhada pelo economista-chefe do Instituto para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério César de Souza, e pelo diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel.

— Este ano tem sido difícil para a indústria e isso vai se refletir no Natal. Em um momento em que a produção devia estar bombando, fica estável. Isso comprova sua fraqueza — aponta Pimentel.

Souza lembra que a indústria sofreu muitas oscilações em 2014, como reflexo dos ajustes de estoques, e diz que as encomendas para o Natal foram, de maneira geral, mais fracas.

A indústria de brinquedos se mostra mais otimista. Segundo o presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), Synésio Batista da Costa, o lançamento de 1.500 brinquedos e a alta do dólar, que encarece os importados, devem ajudar o setor a registrar alta de mais de 10% da produção este ano.

A Multikids, divisão de brinquedos da Multilaser, não está tão otimista. A empresa, que vende bonecos das Tartarugas Ninja, linha infantil de maquiagem, relógios e ateliê de costura, viu as encomendas ficarem 50% abaixo das expectativas.

— Tínhamos uma meta de faturamento de R$ 23 milhões para o Natal, que não será atingida. As grandes lojas alegaram que estavam com estoques elevados — diz Luiz Fiorini, diretor da empresa.

Para a economista Priscilla Burity, do banco Brasil Plural, o movimento fraco da indústria não é exclusividade do período anterior ao Natal: ao longo de todo o ano a indústria vem operando em níveis mais baixos do que no ano passado. Sua projeção é de queda de 2,6% em 2014 e estabilidade em 2015:

— O quadro da indústria é de estagnação. Depois da crise de 2009, teve um ensaio de recuperação em 2011 e em 2013, mas nada se mostrou sustentável. E não temos com o que nos empolgar em 2015: o Banco Central voltou a subir os juros e enfrentaremos dificuldades ligadas à falta de energia e água.

Outra preocupação para 2015, segundo o economista-chefe do Iedi, são os prometidos cortes dos gastos públicos. Se forem em investimentos e não em gastos correntes, a indústria deve sofrer mais.

Apesar da estabilidade da indústria, a pesquisa do IBGE mostra um perfil mais disseminado de taxas negativas. Dezesseis dos 24 ramos pesquisados diminuíram a produção em outubro.

A produção de bens de capital, que mostra o investimento na indústria, ficou estável, mas caiu a produção de bens duráveis (0,8%) e não duráveis (0,6%). Na comparação com outubro de 2013, a indústria produziu 3,6% menos , o oitavo mês seguido de queda na comparação com ano anterior.

Embora ainda falte a análise dos dois últimos meses de 2014 — novembro e dezembro —, André Macedo diz que o cenário não é muito favorável. Nos últimos 12 meses, a queda foi de 2,6%:

— Não se sabe qual será o resultado do ano, é preciso claramente esperar os dois últimos meses, mas o cenário até o momento é de queda.

O fraco desempenho da indústria refletiu encomendas mais modestas do varejo, afirma Aldo Gonçalves, presidente do Clube de Diretores Lojistas do Rio e do Sindicato dos Lojistas do Comércio do Município do Rio, Sindilojas-Rio:
— Os comerciantes encomendaram menos, ninguém está querendo correr muito risco. A indústria não está com bom desempenho porque o comércio está receoso. O ano não foi bom para os lojistas, a classe média está muito endividada, a inflação alta prejudicou o consumo e ainda teve Copa do Mundo e as eleições.

A expectativa do setor para o Natal é de um crescimento de 4%, metade do esperado nesta mesma época no ano passado.

MAIS IMPORTADOS

O varejo de alimentos está sendo menos afetado pela crise, mas também já sente seus efeitos.

— Começamos a notar uma leve redução no tamanho da cesta de compras, mas é cedo para atribuir ao desaquecimento da economia. Os supermercado estão sofrendo menos. Parece que como as pessoas não podem comprar bens mais caros, como carros e duráveis, elas acabam gastando mais com alimentos e bebidas — disse um executivo de uma grande rede de supermercados.

O segmento de importados, que tem grande peso na ceia de Natal, também está apostando em resultado positivo. Pietrangelo Leta, vice-presidente comercial da rede de supermercados Zona Sul, diz que aumentou as compras de bacalhau, bebidas, espumantes e espera vender 3% mais este ano.



Veículo: Jornal O Globo


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