Trocar químico pelo natural na comida processada é desafio para a indústria

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Nos primeiros 90 anos de fabricação do produto que leva seu nome, a Campbell Soup Co. desenvolveu apenas cerca de 100 variedades de suas tradicionais sopas enlatadas. Nos últimos 30 anos, esse número quadriplicou e agora inclui sabores dos mais incomuns, que vão de creme tailandês de coco e tomate a filé com queijo ao estilo da Filadélfia e panqueca mexicana de frango apimentada.

A miscelânea de sopas reflete o crescente apetite do consumidor americano por alimentos com gostos e texturas ousadas e exóticas que, nas últimas décadas, incentivou as companhias a adicionar milhares de novos sabores, temperos, colorantes, espessantes e conservantes a suas receitas, alterando o cardápio do país.

No entanto, os avanços tecnológicos que criaram cereais multicoloridos e iogurte sem gordura com uma infinidade de sabores hoje entram em choque com a crescente demanda por alimentos mais naturais, com ingredientes mais simples, que muitos consumidores consideram mais saudáveis.

Equilibrar essa sobreposição de tendências tem sido um desafio para a indústria de alimentos, que está sob pressão para encontrar fontes naturais confiáveis e baratas para ingredientes que, durante muito tempo, foram produzidos em laboratório.

Atualmente, os consumidores "estão interessados em uma exploração divertida da comida, e, do lado culinário e científico, isso [...] eleva muito o grau de exigência", diz Craig Slavtcheff, diretor de ciência e tecnologia da Campbell. "O desafio é criar esses sabores ousados com ingredientes reais."

Em alguns casos, isso representa um grande quebra-cabeças de pesquisa e desenvolvimento, já que há a possibilidade de custos mais elevados, mas o retorno pode ser maior. Para as empresas de alimentos prontos, novos sabores podem ampliar as vendas de marcas conhecidas, embora os consumidores continuem controlando os gastos com alimentação.

Isso explica porque mesmo os condimentos mais simples agora vêm em dezenas de variedades. A H.J. Heinz Co., que fabricou apenas um tipo de ketchup por 124 anos, começou a produzir novos sabores em 2002. Atualmente são oito, incluindo um com infusão da pimenta jalapeño e outro de vinagre balsâmico.

Para elaborar tais misturas, os fabricantes de alimentos frequentemente procuram empresas especializadas, conhecidas como "flavor houses", algo como usinas de sabores, que costumam arcar com os custos de P&D.

"Em vez de encontrar fornecedores de pimentas, [algumas empresas de alimentos] podem criá-las através de uma usina de sabores", diz Jared Simon, diretor de marketing da fabricante de salgadinhos Hain Celestial Group Inc.

As usinas de sabores não apenas oferecem uma gama enorme de sabores, mas têm também a capacidade de produzi-los em abundância e com baixo custo, sem interrupções sazonais.

A Synergy Flavors, uma companhia americana que faz ingredientes para sorvete, iogurte e outros produtos, por exemplo, atualmente fabrica em torno de 80 mil fórmulas de sabores para alimentos, em comparação com cerca de 13 mil em 2002. Somente de banana, ela oferece aproximadamente 1.000 sabores diferentes, que vão de "banana verde" a "doce de banana".

As pessoas confiaram no sal e condimentos simples para temperar e preservar os alimentos durante milênios. O uso da química moderna para melhorar os alimentos deslanchou durante a Segunda Guerra Mundial, à medida que os governos buscavam produzir refeições mais saborosas, duradouras e nutritivas para os soldados em combate.

O setor de alimentos do pós-guerra expandiu essas inovações e, durante décadas, houve um boom na produção de sabores sintéticos e outros aditivos alimentares. Como resultado, surgiram produtos como o molho de saladas do tipo Ranch, que tem validade de vários meses, e bebidas em pó com sabor de frutas, como o Tang.

Muitas dessas inovações vieram de usinas de sabores, que devem faturar US$ 4 bilhões nos Estados Unidos neste ano, comparado com US$ 2,5 bilhões em 2003, segundo a consultoria Leffingwell & Associates.

As fórmulas dos sabores são secretas, aparecendo nos rótulos em termos vagos como "sabores naturais e artificiais". Em 1950, o Congresso americano determinou que a agência para alimentos e medicamentos dos EUA, a Food and Drug Administration (FDA), aprovasse todos os aditivos alimentares, com exceção apenas dos ingredientes cuja segurança não é garantida, que rotulou de ingredientes "geralmente reconhecidos como seguros", ou Gras, na sigla em inglês. Entretanto, a lei permite que as empresas informem se os itens que utilizam pertencem à categoria Gras, exceto os corantes.

Em 1972, o FDA começou a permitir que as empresas buscassem confirmação oficial de que suas substâncias eram Gras. Mas com a explosão de novos ingredientes e o acúmulo de petições, a agência encerrou esse procedimento em 1997. Atualmente, as empresas podem notificar o FDA sobre seus ingredientes Gras, mas muitas não se dão ao trabalho.

Não há uma contagem definitiva sobre quantos aditivos de alimentos são usados hoje nos EUA. A Pew Charitable Trust, fundação sem fins lucrativos, estima um número perto de 10 mil. Alguns geraram polêmica e acabaram rejefusiitados pelo consumidor, como o adoçante aspartame que, segundo críticos, é cancerígeno, e o castóreo, uma excreção anal do castor, usada no aromatizante de baunilha.

Nos últimos anos, um crescente número de consumidores tem buscado evitar esses ingredientes em suas dietas, em grande parte pela influência de livros, filmes e grupos de defesa que levantaram dúvidas sobre os efeitos desses aditivos na saúde, assim como um desejo mais amplo de saber exatamente o que estão comendo.

"Eu quero tudo natural", diz Chris Stanley, executivo de vendas de 44 anos de uma empresa do Texas que fornece serviços de tecnologia de informação. Há quatro anos, Stanley decidiu adotar uma dieta mais saudável. "Gostaria que houvesse um mínimo de aditivos", diz ele.

Para se ajustar a essas mudanças na demanda do consumidor, as usinas de sabores cada vez mais estão utilizando substâncias naturais, como tomates ou sabugueiro, para criar a coloração vermelha, em vez da tintura Vermelho 40.

Há cerca de 10 anos, quando a Campbell procurava reduzir o conteúdo de sódio de suas sopas, uma usina de sabor sugeriu a adição de um composto químico que permitiria que a empresa cortasse o sal sem afetar o sabor. Mas a Campbell acabou optando pelo uso do sal marinho, que contém menos sódio que o sal comum de mesa e é natural.



Veículo: Valor Econômico


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