Fungo castiga produção de bananas no Vale do Ribeira

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O engenheiro agrônomo Roberto Kobori jamais vai se esquecer do ano de 2003, quando deu a notícia aos bananicultores da porção paulista do Vale do Ribeira (também se estende pelo Estado do Paraná) que a região apresentava sérios focos de Sigatoka negra, doença incurável surgida no Caribe e causada pelo fungo Mycosphaerella fifiensis, que se espalha com o vento e passou a contaminar cultivos de todo o país a partir do fim dos anos 1990 - exceto no Nordeste, por razões não muito claras.

O Vale do Ribeira e a Bahia respondem por um terço da colheita nacional de 7 milhões de toneladas das variedades nanica e prata, consideradas as mais comerciais, que compõem o mercado de fruticultura avaliado em US$ 5,8 bilhões ao todo. As exportações da fruta não são tão expressivas - US$ 45,3 milhões por ano, com 139,5 mil toneladas, conforme dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) - em razão da qualidade considerada inferior para o comércio internacional.

No Vale do Ribeira, o controle do fungo é feito às custas de fungicidas, que exigem gastos anuais de R$ 1,6 mil a R$ 2 mil por hectare, e da adição de adubo no solo, mais R$ 2,5 mil a R$ 3 mil por hectare ao ano. Somados, esses gastos respondem por um aumento de 50% no custo de produção para o agricultor da região.

A elevação dos custos foi responsável pela diminuição de 5,6 mil hectares de cultivo (para os atuais 36 mil) e abandono da atividade por 441 propriedades (que hoje somam 3.483), durante o período de 2000 a 2008, conforme os únicos dados disponíveis elaborados em parceria pela Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati) e pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA), ambos ligados à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.

"Não é uma lavoura a preço de banana", declara Edson Hayashi, que comercializa por R$ 1 a caixa (de 11 quilos) da prata e R$ 0,60, a nanica. O agricultor, que colhe 972 toneladas anuais da fruta, se estabeleceu em Registro (SP) antes da chegada da doença. Mas não hesitou, ao lado de um grupo de produtores, em prestar atenção ao alerta do amigo Roberto Kobori e às orientações do engenheiro agrônomo Edson Nomura, da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA). Em pouco tempo, Hayashi constatou na sua plantação o aparecimento de pontinhos escuros na parte inferior das folhas, que se transformam em estrias, responsáveis por derrubar a folhagem por completo, impossibilitando o desenvolvimento dos cachos da planta.

Na época, o produtor logo aceitou a proposta de juntar sua propriedade a outras seis, em um programa inicial de controle da doença, que se instala em lugares com alta temperatura e umidade elevada, por meio de uma tecnologia que leva o simples batismo de monitoramento. "Por enquanto, estamos ganhando a batalha", comemora Hayashi.

Todas as quartas-feiras, os agricultores saem a campo e selecionam dez plantas em um raio de 50 quilômetros. As folhas mais novas (chamadas de velas ou charutos) são vistoriadas com uma lupa para enxergar os esporos do fungo. Se sua presença for constatada, o produtor faz uma marcação em uma placa pendurada na planta. Essas anotações são levadas para um programa de computador desenvolvido pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), que aponta a hora certa da pulverização.

A técnica permitiu que o Brasil reduzisse as aplicações de fungicidas, que hoje somam dez por ano, em comparação às 52 da Costa Rica e 32 do Equador, importantes produtores da fruta.


No entanto, o agrônomo Roberto Kobori informa que apenas 3% das propriedades do Vale do Ribeira aplicam o monitoramento. A maior parte ainda utiliza o calendário tradicional de fungicidas (com 12 aplicações anuais em alguns casos), que nem sempre coincide com o melhor momento de combater a doença. Os pequenos produtores contam com a sorte.

A banana é a principal atividade econômica do Vale do Ribeira, que ainda abriga uma produção bastante familiar e amadora. E não é de hoje que a região convive com o ataque de pragas nos plantios. Antes da Sigatoka negra, havia a amarela, provocada pelo fungo aparentado Mycosphaerella musicola, que causa uma doença mais branda.

Segundo Roberto Kobori, só agricultores tecnificados irão permanecer na atividade de forma profissional nos próximos anos. "A doença é muito agressiva e vai ser o fiel da balança daqui a algum tempo", comenta.

O jovem produtor Wagner Magário, de 30 anos, é um desses representantes do futuro. Pertencente à terceira geração de uma família tradicional de bananicultores da região - o Grupo Magário - ele acompanhou o pai na lida de "domar a praga" e adotar as técnicas recomendadas pelo agrônomo Edson Nomura, da Apta: adensamento de 2,5 mil plantas por hectare, retirada das folhas velhas que são depósitos do fungo e drenagem do solo por meio da abertura de uma vala para o escoamento da água. E muita observação.

Diariamente, Magário percorre trechos dos 140 hectares cultivados com a variedade nanica, que lhe rendem 4,2 mil toneladas por ano. A família, assim como outros grandes produtores do Vale, também mantém plantios em Minas Gerais. No Estado, os Magário colhem 12 mil toneladas de banana prata e as duas safras são escoadas para mercados do interior paulista por meio da própria empresa que controla toda a cadeia produtiva.

Apesar da sua função estar mais ligada ao campo, o produtor sabe como ninguém como o fungo pode causar prejuízos em caso de descontrole. Mesmo assim, Wagner Magário não abre mão de acreditar que a bananicultura ainda pode ser um bom negócio. Na sua opinião, a prova está no grupo de produtores do qual participa, que ganhou a batalha contra uma doença que prometia dizimar os bananais da região. "Todos os meses colocamos um fruto de qualidade, que chega bonito no mercado, sem vestígio de um fungo que rodeia a plantação", avalia.



Veículo: Valor Econômico


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