Problemas climáticos e alta do dólar encarecem o "arroz com feijão"

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                    Em um ano, a alta média desses produtos foi de 20%, de acordo com o IPCA-15. Especialistas temem desabastecimento.

Os brasileiros estão pagando 20% mais para comer o tradicional prato feito (PF) de arroz, feijão, carne, batata e salada em casa. A alta média desses produtos foi quase o dobro da inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) de 12 meses, que fechou janeiro em 10,74%. No mesmo período do ano passado, a variação em relação a 2013 havia sido de cerca de 10%.

E, se os preços estão altos, podem subir ainda mais, e até faltarem produtos, segundo especialistas. Com excesso de chuvas — principalmente na Região Sul do país—, o Rio Grande do Sul, que detém 70% da produção nacional de arroz, registrou perdas e atraso no plantio. O mesmo ocorreu no Paraná, que responde por cerca de 24% do feijão produzido no país. Minas Gerais, que produz 30% do total de batatas, sofreu com uma seca intensa.

A quebra da safra do arroz, por exemplo, obrigará o país a praticamente dobrar a importação do produto. No caso do feijão-carioquinha, em que não há a possibilidade de trazer de outro país, o Instituto Brasileiro do Feijão prevê desabastecimento entre 20 de fevereiro e 20 de abril, quando entra no mercado a segunda safra.

Segundo o economista Márcio Milan, da Tendências Consultoria, o clima ainda influenciará negativamente os preços por alguns meses. “O ambiente ainda é adverso e seguirá pressionando o IPCA”, reforçou. A expectativa, no entanto, é de que o quadro mude em abril ou maio, quando cessam os efeitos do fenômeno natural El Niño, responsável pelo excesso de chuvas e pela estiagem em algumas regiões do país, prevê a meteorologista Patrícia Madeira, da Climatempo.

“Depois disso, com a vinda do período seco, entre abril a setembro, devemos observar uma normalidade na região central, de poucas chuvas. No Norte e no Nordeste, a expectativa é de chuva abaixo do normal, mas sem seca severa. Nas outras áreas, devemos observar irregularidade das chuvas, com períodos secos intercalando dias chuvosos”, disse.

Orçamento

Mesmo apresentando menor variação de preço, a batata e cortes de carne, como o patinho, continuam impactando no orçamento do servidor público Aurélio Cavalcante, 29 anos. “Para mim, não tem nada barato. Noto que, há seis meses, os valores só aumentam.”

O sentimento de Cavalcante, de que tudo fica mais caro no PF, não é à toa. Em 12 meses, somente o tomate subiu 61,3%. Para driblar a alta do produto, Aurélio está reduzindo a quantidade consumida. “Não tem muito o que fazer”, disse.

Mas não é só o clima que determina o aumento nos preços de alimentos; outro fator com peso fundamental é a valorização do dólar, que elevou em 25% os custos de produção do arroz na safra 2015/2016 em relação à colheita anterior, a maior alta desde a implementação do Plano Real, afirmou o economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz. Os preços de itens cotados na moeda, como agroquímicos e fertilizantes, subiram 19% e 44%, respectivamente. Ele, no entanto, avalia que os alimentos não são a “causa, nem o fim” do aumento da inflação dos pratos feitos.

O economista-chefe da Farsul ressalta que, além do excesso de chuvas e do câmbio, o governo represou por muito tempo os preços dos combustíveis e, em 2013, reduziu as tarifas de energia elétrica. Esses dois efeitos desencadearam, em 2015, o aumento da gasolina, do diesel e da conta de luz, tornando o repasse ao consumidor inevitável. “São insumos que pesam no custo de produção”, destacou. Para ele, a postura do Banco Central no controle da inflação é equivocada. “Poderíamos combater a carestia com taxas de juros mais baixas. O crédito mais caro está massacrando os produtores.”

Marmita

Se comer em casa o tradicional arroz e feijão está caro, imagine fora de casa. O fotógrafo Caetano Brito, 64 anos, pagava há dois meses R$ 10 por um prato com arroz, feijão, carne, salada e batata frita. Hoje, não desembolsa menos de R$ 12, um gasto que representa uma alta de 20%, acima do aumento de 10,4% medido pelo item de refeição fora do lar, do IPCA-15. Para reduzir os custos, decidiu almoçar mais vezes em casa. “Quando não é possível fazer isso e o dinheiro está curto, vou a um self-service e procuro comer o menos possível. Acabo ficando com fome, mas é a única forma de cortar as despesas”, afirmou.

O servidor público Raphael Fernandes, 30, observa, há quatro anos, o encarecimento da refeição. Em 2012, pagava R$ 9 por um prato feito, atualmente sai a R$ 17, um salto de cerca de 89%. O vale-refeição, em contrapartida, sofreu reajuste de 25% no período. “Estou levando comida de casa com mais frequência para economizar porque não vejo condições de essa inflação reduzir. Talvez os preços recuem um pouco só por um aumento de concorrência, com mais comerciantes vendendo a marmita”, avaliou.

Pressão

A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) acredita que os fatores climáticos tendem a manter pressionados os preços de hortaliças e frutas no atacado durante o primeiro trimestre deste ano. Com menos produtos em oferta, as Ceasas da Região Sudeste comercializaram pouco mais de 250 mil toneladas de hortaliças, em dezembro, o pior resultado mensal em pelo menos três anos. No Centro-Oeste não foi diferente. Com menos oferta para atender o mercado, o tomate foi vendido a R$ 4,15 no Ceasa de Goiânia, um aumento de 55,28% em relação a novembro.

 



Veículo: Jornal Correio Braziliense - DF


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