Embarque de óleo de soja do país despenca

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A indústria nacional de óleo de soja vem abdicando de sua participação no comércio externo e direcionando uma parcela mais significativa da produção ao mercado doméstico. Na última década, as exportações brasileiras do produto caíram à metade, pressionadas por entraves tributários, pela concorrência global com outros óleos vegetais e, especialmente, pela maior demanda por biodiesel no país. Embalado pelo biocombustível, o consumo interno de óleo de soja, sua principal matéria-prima, quase dobrou em dez anos - o que reforça o crescente foco das esmagadoras no mercado interno.

Essa mudança no perfil das vendas de óleo ganhou força a partir de 2005, quando o governo federal aprovou a lei para a mistura obrigatória de biodiesel ao diesel no país, com uma adição inicial de 2%. Naquele ano, o consumo doméstico de óleo de soja somou 3,11 milhões de toneladas, conforme a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). Mas a perspectiva da entidade é fechar 2014 com volume 92,8% superior, de 6 milhões de toneladas, que tende a ser o maior da série histórica. Já as exportações, de 2,64 milhões de toneladas em 2005, despencaram e totalizam apenas 1,226 milhão no acumulado deste ano até novembro, de acordo com o Secex/Mdic. Para 2015, a expectativa da Abiove é mais pessimista: 900 mil toneladas, baixa de 66% ante 2005.

"O consumo do óleo como alimento [humano] não aumentou e também não se vê maior demanda pela indústria de tintas. O que está fazendo o mercado interno valer a pena é o biodiesel", diz Andrea Gaia, coordenadora da corretora UniAmerica, especializada no segmento de óleos vegetais.

De acordo com Andrea, o óleo de soja bruto é a matéria-prima utilizada tanto para a fabricação de biodiesel quanto para o envio à exportação. Em Mato Grosso, maior produtor nacional de soja, o óleo está sendo negociado a cerca de R$ 1.880 por tonelada, sem impostos. Se encaminhado à exportação pelo porto de Santos (SP), o produto teria acrescido ao menos R$ 300 de frete por tonelada - afora outros custos, como o de "tancagem" (armazenamento) e a documentação para exportação.

"O óleo mato-grossense chegaria a US$ 808 por tonelada em Santos, e o mercado lá fora não paga esse preço. No porto de Rosário [na Argentina], por exemplo, a cotação está entre US$ 766 e US$ 775", afirma Andrea. Ainda assim, a corretora pondera que diferenças regionais devem ser consideradas. No Paraná, onde a logística é menos complexa pela presença do porto de Paranaguá, o vendedor fica mais livre para optar entre os mercados interno e externo, e o dólar costuma ser o 'fiel da balança'.

"O frete não pesa tanto no Estado, e o óleo chega a Paranaguá a até R$ 2,08 mil por tonelada [cerca de US$ 770, considerando um dólar a R$ 2,69]. Com o dólar alto, as empresas locais podem exportar mais, diferentemente de Mato Grosso, Goiás e Mato Grosso do Sul, onde a questão logística inviabiliza", diz Andrea. A isenção de tributação para esmagadoras que vendem a usinas de biodiesel no mesmo Estado, acrescenta, é um componente adicional para reduzir o interesse de exportação do óleo processado no Centro-Oeste.

Apesar de haver esse tipo de incentivo fiscal, as processadoras do país padecem com outras limitações, avalia Fábio Trigueirinho, secretário-geral da Abiove. "Infelizmente, o Brasil não tem uma política de incremento da exportação de valor agregado, caso de óleo e farelo de soja", diz. Ele lembra que os entraves remetem à Lei Kandir, de 1996, que desonerou a venda externa de soja em grão, mas não fez o mesmo com a produção de farelo e óleo para exportação.

É certo que, no contexto global, pesam também o aumento da competição com outros óleos, especialmente o de palma. Atualmente, o preço desse óleo está mais de 10% abaixo do da soja no mercado internacional, na casa de US$ 600 por tonelada. "O balanço de oferta e demanda de óleos vegetais continua folgado. A produção de óleo de palma deve aumentar novamente em 2014/15 e no mercado externo, portanto, os preços do óleo de soja também não estão atrativos", avalia Natalia Orlovicin, analista da FCStone.

Em meio a esse cenário de perda de competitividade, chama a atenção o descompasso entre a produção e o processamento de soja no Brasil. Nas contas da Abiove, o país chegou a esmagar 37,3 milhões de toneladas em 2011, mas esse volume deve ser um milhão de toneladas menor este ano, mesmo a safra do grão tendo crescido mais de 10 milhões de toneladas no período.

Contudo, para a analista da FCStone, a expectativa é que a elevação na mistura de biodiesel de 5% para 7%, feita este ano, contribua para uma reação no esmagamento, que pode crescer a 39 milhões de toneladas. Já as exportações tendem a perder ainda mais força. "É provável que mais óleo de soja deixe de ser embarcado no ano que vem para atender à demanda interna. Em 2014, o biodiesel respondeu por 30% do consumo interno de óleo, mas deve passar a 50% em 2015, ou 3,45 milhões de toneladas", projeta. Na sexta-feira, a Agência Nacional de Petróleo (ANP) realizou o último leilão de biodiesel do ano, que negociou 667,8 milhões (87,3%) dos 764,5 milhões de litros ofertados.



Veículo: Valor Econômico


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