Barilla quase dobra vendas no país com massa para a classe C

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Líder global no mercado de macarrão, a italiana Barilla ampliou em 84% o volume de vendas no Brasil em 2013. A expansão expressiva é atribuída ao lançamento, há pouco mais de um ano, de uma versão mais barata de suas massas - um macarrão com ovos e farinha de trigo comum, fabricado em Contagem (MG) numa joint-venture com a brasileira Vilma Alimentos. O produto custa menos de R$ 3.

"O Brasil foi uma exceção no ano passado e, pelos números que temos até maio, a expectativa é muito boa", afirmou Claudio Colzani, CEO da Barilla, em entrevista ao Valor em Parma, cidade da Emília Romana onde fica a sede da empresa. "Devemos esse resultado a um produto pensado especificamente para a população do país, que é composta em sua maioria pela classe C."

Segundo o executivo, após estudar o mercado brasileiro, a companhia percebeu que deveria investir na base da pirâmide. "Percebemos que não precisaríamos montar uma fábrica, porque o país tem uma capacidade produtiva muito grande para massa", afirma. Mas a receita teria que mudar, já que o Brasil não tem grano duro (variedade especial do trigo) - matéria-prima essencial da massa italiana. O insumo teria que ser importado do México, dos Estados Unidos ou da Argentina. "Imagine os impostos", diz Colzani. "Então, fomos ao encontro dos ingredientes e hábitos locais. Porque a classe C não pode gastar R$ 6 num pacote de massa, que é o preço de nossa linha básica, a mais vendida no mundo."

O novo produto garantiu à Barilla do Brasil a melhor performance do grupo entre os Bric, seguida pela China. Até 2020, o plano é faturar entre € 100 milhões e € 120 milhões no Brasil, com produtos para todos os públicos. Embora o país seja o terceiro produtor global de massas, os brasileiros ainda consomem pouco: 6 quilos por pessoa ao ano. Na Itália, o consumo per capita está acima de 20 quilos e, nos EUA, em torno de 8.

Não se trata, entretanto, de um mercado pequeno. O Brasil movimenta R$ 2,2 bilhões ao ano no segmento de massas alimentícias. Do volume vendido, apenas 3% são massas de grano duro, os outros 97%, de farinha comum. Hoje, a Barilla é líder no mercado brasileiro de grano duro, com 35%, e, no futuro, pretende estar entre os principais fabricantes de massas de farinha comum. "Vendemos muita Barilla de grano duro, mas só para classes A e B. Atualmente, nossa fatia do mercado total de massas é de 1,5%, mas temos planos de crescer para 8% a 10% no longo prazo."

Para um público ainda mais restrito, no próximo mês, desembarca no país a linha de massas Academia Barilla, com denominação de origem 100% italiana, voltada para um nicho gourmet e que custará por volta de R$ 10. O selo Academia já está à venda na Itália e, além de massas, oferece ingredientes regionais da cozinha italiana como azeite de oliva, aceto balsâmico de Modena, queijo parmigiano reggiano e presunto de Parma. No Brasil, chegarão inicialmente sete formatos de massa, que irão para pouquíssimos pontos de venda. "Temos planos para a linha Academia, mas nossa prioridade no Brasil continua sendo ampliar a distribuição da massa com ovos, a mais barata", reafirma Colzani.

A Barilla é uma das maiores empresas alimentícias da Itália e faturou € 3,2 bilhões em 2013, com uma alta de 2,5%. Os países do Bric e da América do Norte puxaram o avanço. Para o CEO, o mais importante é que, pela primeira vez nos últimos anos, a empresa retomou o crescimento em volume, que foi acima de 4%.

"Na Itália não crescemos, mas mantivemos o faturamento de 2012 e o mesmo volume. Aqui, o setor de alimentos teve uma queda de 3% ao longo dos últimos cinco anos. Então, num mercado que está em queda, manter o mesmo patamar é positivo. Na verdade, ganhamos participação no mercado europeu e no mundo. Crescemos acima de 10% nos EUA e ampliamos nossa participação no mercado da Europa em mais de 3%."

Cerca 80% do mercado da Barilla se concentra na Europa (51% na Itália). Nos países que mais cresceram, a fatia da receita é menor: 15% nas Américas e 5% na Ásia. Uma alavanca para o aumento nas vendas nos Estados Unidos foi o lançamento, em setembro do ano passado, da linha sem glúten. "Chegamos muito atrasados nesse segmento, mas em poucos meses conquistamos 30% do mercado 'glúten free' nos EUA. Colocamos a massa na Itália, em janeiro, e agora não temos produto para entregar. Entramos na França e não temos produção para ir para a Alemanha. O mesmo problema está atrasando o lançamento no Brasil", diz o CEO. A linha sem glúten é produzida na Itália, com farinha de milho e arroz, numa unidade específica para não haver contaminação. Já está sendo estudada a construção de uma segunda fábrica nos EUA.

Neste ano, pela primeira vez, a Barilla lançou seu balanço anual reunindo informações financeiras e ambientais. Neste último quesito, Colzani ressalta que a empresa não fica só no marketing. Conta que serão investidos € 15 milhões para trazer um ramal de trem de alta velocidade até à fábrica de Pedrignano, em Parma. "Nossa intenção é escoar os produtos para toda a Europa por essa via e tirar 3,5 mil caminhões das ruas e estradas europeias a cada ano."

Outra iniciativa é a busca de apoio de multinacionais para a criação de um acordo global na área alimentar: o "Protocolo de Milão". Trata-se de uma carta de intenções, que deverá ser assinada por vários países durante a Expo Milão, que acontecerá na cidade italiana entre junho e agosto de 2015. O documento deverá propor medidas para enfrentar problemas como fome, obesidade e desperdício. "Outro tema do protocolo tem muito a ver com o Brasil e esperamos sua colaboração", enfatiza o CEO. "Queremos limitar o uso de grandes extensões de terra para alimentar o gado e para a produção de combustíveis."

Em 2009 a criação da Fundação Barilla Center for Food and Nutrition representou uma mudança de rumo na política alimentar da empresa. Com ela, os gestores da família sentaram-se à mesa com nutricionistas, economistas, membros da FAO e até com o ativista Carlo Petrini, fundador do movimento Slow Food. Desde então, 173 produtos foram reformulados para causar menor impacto ao ambiente e menos malefícios à saúde.

Apesar de ações como essas, a imagem da companhia sofreu desgaste no ano passado, por uma declaração à imprensa do presidente Guido Barilla, que com os irmãos Luca e Paolo, comanda a companhia. Numa entrevista a uma emissora de TV italiana, em setembro, Guido afirmou que a marca nunca faria um comercial com um casal homossexual. A afirmação teve repercussão negativa e o empresário se desculpou depois, mas não conseguiu aplacar a ira contra a empresa nas redes sociais. Ao que tudo indica, o boicote proposto à marca pela comunidade gay foi um assunto bastante debatido na blogosfera, mas não se exprimiu em queda nas vendas. O Brasil que o diga.

A repórter viajou a convite da Barilla e da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio, Indústria e Agricultura



Veículo: Valor Econômico


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