Cresce mercado para os orgânicos no Brasil

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Estimativa do segmento é de incremento de 20% por ano, impulsionado também por artigos da linha têxtil


Mesmo que ainda longe de se firmar, a produção de orgânicos vem crescendo no País como uma alternativa para consumidores exigentes e preocupados com a saúde e o meio ambiente. Para atender ao que ainda é um nicho de mercado, empresas e agricultores apostam no uso da produção sustentável, não só para os alimentos, mas também para peças do vestuário, cosméticos e medicamentos.

Segundo a coordenadora do Centro de Inteligência em Orgânicos (CI Orgânicos), Sylvia Wachsner, o mercado para esse setor cresce 20% ao ano. Um dos motivos é a utilização da produção para outros fins. “Cosméticos é uma área que está crescendo. Já existem também empresas que estão fazendo produtos de limpeza. Existem pessoas que são alérgicas aos químicos que vão nos produtos de lavar a louça. Eles são bons para as pessoas que usam e também para a água”, explica Sylvia.

Um exemplo é a Cooperativa Central Justa Trama, que fabrica peças de vestuário com base na produção agroecológica de algodão. Com base em Porto Alegre, reúne cerca de 700 trabalhadores de cinco estados brasileiros que trabalham desde a produção até a confecção das peças, passando pela tecelagem e fiação. Segundo a diretora-presidente da Justa Trama, Nelsa Fabian Nespolo, a articulação iniciou ainda no Fórum Social Mundial de 2005, realizado na Capital gaúcha, com a produção de 60 mil sacolas ecológicas. “A partir daí, a Justa Trama foi tomando corpo e começou a fazer as primeiras peças de algodão orgânico. Em 2008, começamos a fazer toda esta parte jurídica de constituir como uma cooperativa central das associações que trabalham com essa produção”, destaca.

Para Nelsa, o mercado da produção orgânica começa a se firmar a partir da consciência dos consumidores em relação aos produtos corretamente responsáveis com o meio ambiente. Para a diretora da cooperativa, o apelo ao orgânico é uma demonstração muito concreta do consumidor de que ele quer melhorar o ambiente e afirmar o compromisso de que quer mudar o planeta. “Temos buscado todos os espaços possíveis, desde feiras, lojas alternativas. Temos muitas organizações que na hora de fazer uma camiseta pensam na questão do meio ambiente e optam por fazer um produto orgânico. A nossa grande surpresa é que geralmente as pessoas que adquirem um produto são as que voltam para continuar adquirindo”, revela.

A grande dificuldade ainda é na obtenção da matéria-prima para a fabricação. O algodão que produz a roupa confeccionada pela Justa Trama vem do sertão do Ceará. Apesar do custo baixo, guiado pela norma que rege a economia solidária, Nelsa salienta que há uma dificuldade momentânea na região devido à seca no Nordeste brasileiro. “Mesmo assim, temos ampliado as nossas bases para outro estado, que é o Mato Grosso do Sul, onde começamos com seis agricultores e está se expandindo”, afirma Nelsa.

Formas de certificação da produção orgânica

Certificação por auditoria: A concessão do selo SisOrg é feita por uma certificadora pública ou privada credenciada no Ministério da Agricultura. O organismo de avaliação da conformidade obedece a procedimentos e critérios reconhecidos internacionalmente, além dos requisitos técnicos estabelecidos pela legislação brasileira.Sistema participativo de garantia: Caracteriza-se pela responsabilidade coletiva dos membros do sistema, que podem ser produtores, consumidores, técnicos e demais interessados. Para estar legal, um SPG tem que possuir um Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (Opac) legalmente constituído, que responderá pela emissão do SisOrg.


Controle social na venda direta: A legislação brasileira abriu uma exceção na obrigatoriedade de certificação dos produtos orgânicos para a agricultura familiar. Exige-se, porém, o credenciamento numa organização de controle social cadastrado em órgão fiscalizador oficial. Com isso, os agricultores familiares passam a fazer parte do Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos.
 

Espaço é destaque na revenda de itens agroecológicos

Além do mercado para quem produz, os orgânicos também abrem espaço para quem se interessa em revender os produtos feitos da base agroecológica. É o caso de Glaci Borges e Heloisa Palaoro, que são representantes no Rio Grande do Sul da Phytos Essencial, que produz óleos terapêuticos no Cerrado brasileiro. Há quatro anos, Heloísa conheceu uma aromatologista goiana que apresentou o produto. A partir dessa data, nasceu a Gurias dos Óleos. Conforme Glaci, a venda começou apenas entre amigos. “Essa rede foi abrindo e cada vez mais começamos a vender muito mais, dentro da capacidade de produção, que é pequena, já que essa produção é artesanal. Vendemos entre 300 e 400 óleos por mês em média”, conta.

Uma das principais características desses consumidores, conforme Glaci, é a fidelidade na compra dos produtos naturais. “É um produto que trabalha com o afeto, aproxima as pessoas, proporciona bons momentos, alivia as dores e relaxa”, ressalta. A atividade de vendas dos óleos é feita de forma paralela com as profissões das duas. Enquanto Heloisa é atriz e professora de teatro, Glaci é produtora de educação. “Nunca vimos isso como algo para ganhar dinheiro, mas eu já vivi com o giro dessa renda, que me sustentou por pelo menos seis meses. Temos um capital que, se precisamos, nós usamos. Mas nunca tivemos intenção de ganhar dinheiro, mas de trazer algo que faça bem às pessoas”, informa Glaci.
Regulamentação ainda é entrave para o fomento

Apesar dos incentivos de governos e instituições para fomentar a produção orgânica, as dificuldades de legislação e a burocracia ainda emperram o avanço da produção orgânica no País. Segundo Sylvia Wachsner, da CI Orgânicos, um dos principais entraves está na regulamentação dos produtos, que não é unificada. Enquanto os alimentos passam pelo Ministério da Agricultura, por exemplo, os cosméticos são regulados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e os fitoterápicos pelo Ministério da Saúde, o que cria diferentes normas para cada produto. Sylvia também lembra que muitos insumos para a produção orgânica carecem de reconhecimento. “Existe uma briga entre Anvisa, Ministério da Saúde e Ministério da Agricultura. O Ministério da Saúde não reconhece orgânicos que no exterior são reconhecidos. No caso de certos insumos para a agricultura orgânica, o Ministério da Agricultura tem uma lista de 200 produtos que ainda não foram aprovados. A burocracia é demorada e atrapalha”, avalia.

Já a presidente da Associação dos Produtores da Rede Agroecológica Metropolitana (Rama), Silvana Bohrer, também ressalta o custo da mão de obra como um fator de desestímulo. “Na produção convencional, já falta mão de obra e a produção orgânica demanda muito trabalho por não usar agrotóxicos. Ela passa a ser mais cara em alguns produtos”, revela. A percepção do custo do produto ao consumidor é outra barreira também lembrada por Silvana como um limitador para o consumo dos orgânicos. Por isso, conforme a produtora, as feiras ecológicas desempenham um papel fundamental na relação de comércio direto entre produtor e consumidor.  “Alguns produtos nos supermercados chegam a custar até quatro vezes mais do que nas feiras”, informa a presidente da Rama.

O cultivo e comércio de orgânicos foram aprovados por lei em dezembro de 2003, mas regulamentados apenas quatro anos depois. Desde janeiro de 2011, o governo federal criou o Cadastro Nacional de Produtores de Orgânicos. Entre produtores, cooperativas e associações, a última atualização do cadastro do Ministério da Agricultura, de 28 de maio de 2013, possuía 5.224 registros, dos quais 658 no Rio Grande do Sul.



Veículo: Jornal do Comércio - RS


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